A quem servirá a inspeção veicular?

 

Esses são alguns comentários de leitores em matéria que produzi sobre como a inspeção veicular pode fomentar o comércio ilegal de placas pretas no País. Como se sabe, a partir de 2019 a inspeção já deverá estar implantada em todos os Estados, seguindo resolução do Contran. Os veículos de coleção, identificados pela placa preta, estarão isentos.

O que acontece é que muitos veículos com os mais de 30 anos exigidos não atendem a todos os critérios necessários para placa preta, por terem alguma modificação ou não estarem em perfeito estado de conservação. Também existem colecionadores que simplesmente não querem a identificação por entenderem ser um gasto desnecessário.

Os donos de carros antigos sem placa preta pretendem derrubar a exigência de vistoria. Um abaixo-assinado com esse intuito circula na internet e conta com mais de 16 mil assinaturas. O documento ainda amplia a faixa de isenção, pedindo que sejam considerados isentos os carros com mais de 20 anos de fabricação.

Abaixo-assinado na internet tenta liberar veículos com mais de 20 anos da inspeção

A questão é a seguinte: se esses carros forem inspecionados, serão aprovados? Provavelmente não. Mas é justo que sejam reprovados?

Argumentos

Quem concorda com o abaixo-assinado argumenta que estes veículos não rodam diariamente, apenas frequentam exposições e encontros aos finais de semana, o que não justificaria o rigor das fiscalizações.

O objetivo oficial da inspeção é garantir que apenas veículos em pleno estado de conservação circulem, aumentando a segurança no trânsito e beneficiando o meio ambiente. Para isso, serão avaliados desde a mecânica até os níveis de emissões de poluentes. Mas esta inspeção já ocorreu na cidade de São Paulo e foi suspensa por Fernando Haddad em 2013 justamente por suspeitas de irregularidades.

Não apenas donos de carros antigos, mas qualquer motorista que não esteja com as manutenções ou a documentação em dia tentará dar um jeito de burlar a vistoria. Como? Ou não comparecendo (e aí não sei como procederão os órgãos de trânsito) ou pagando propina (supondo que os responsáveis sejam corruptíveis).

Irregularidades

Os Detrans dos Estados ainda estão definindo as normas e o calendário das inspeções. Possivelmente empresas terceirizadas, devidamente credenciadas, farão as vistorias. E quem garante que não haverá empresas mal-intencionadas neste bolo?

É o que ocorre no caso das placas pretas, segundo os próprios colecionadores: empresas concedem certificados de originalidade a veículos fora dos critérios, visando apenas lucro. O Denatran diz que está investigando algumas denúncias nesse sentido. Um conhecido me garantiu que até uma Brasília com motor de Fox Flex circula com placa preta por São Paulo.

Foto de Corolla da década de 1990 com placa preta circula na internet: irregularidade

Credibilidade em xeque

Bizarrices à parte, a reação negativa à inspeção antes mesmo de seu efetivo início mostra o quanto os brasileiros estão escaldados com a corrupção e com normas que não dão em nada. Recebi uma lista de 10 motivos para ser contrário à inspeção onde são citados os famigerados kits de primeiros socorros e o caso dos extintores de incêndio, que todos nós fomos obrigados a trocar e depois não serviram para nada.

Medidas como essas em nada contribuem para a credibilidade dos órgãos de trânsito, é verdade. Mas a inspeção veicular já era prevista desde o Código Brasileiro de Trânsito de 1997, faltava apenas a regulamentação. Desde que feita de forma correta, com as devidas ressalvas e critérios justos, servirá verdadeiramente a um trânsito mais seguro e agradável, e não a interesses pessoais e/ou escusos.

Cecília França é jornalista, com passagens pelos diários Tribuna do Norte e Folha de Londrina, onde iniciou da cobertura do setor automotivo. É colunista e mantém o blog Autos Papos (www.autospaposlondrina.com).

Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on telegram
Telegram
Share on whatsapp
WhatsApp